Por indígenas e negros libertos – Um olhar étnico sobre o Amazonas do século XIX

Em setembro, o livro do mês escolhido pela Editora UEA foi Nascidos no Grêmio da Sociedade: racialização e mestiçagem entre os trabalhadores na província do Amazonas (Brasil, séc. XIX), escrito pelo historiador Tenner Inauhiny de Abreu. Nele, o autor fala sobre a formação da classe trabalhadora na Província do Amazonas no século XIX, com foco na questão da racialização e mestiçagem entre os trabalhadores. Ele apresenta uma análise histórica detalhada sobre a formação da classe trabalhadora na região, destacando a importância dos grêmios como espaços de sociabilidade e organização dos trabalhadores. Inauhiny também discute sobre a miscigenação, a diversidade étnica e cultural da região, o contexto do nascimento de uma classe, a importância dos grêmios e a relação entre raça e classe na formação da classe trabalhadora.

No capítulo 1 do livro, o autor cria um pequeno panorama historiográfico a respeito do mundo do trabalho e da escravidão, assim como aborda a questão da racialização e mestiçagem entre os trabalhadores na Província do Amazonas no século XIX. Inauhiny analisa como a miscigenação entre indígenas, negros e brancos foi vista e interpretada na época, tanto pela elite quanto pelos próprios trabalhadores. Ele fala sobre os grêmios como espaços de sociabilidade e organização dos trabalhadores, que muitas vezes eram formados por pessoas de diferentes origens étnicas. Além disso, também discute as diferentes estratégias utilizadas pelos trabalhadores para lidar com a questão da mestiçagem, como a valorização da “branquitude” e a busca por uma identidade coletiva baseada na classe social.

Em especial, nas últimas seções deste capítulo, o escritor aponta as noções de raça introduzidas no século XIX e como elas foram usadas para justificar as sociedades escravagistas. No entanto, ele conclui, em contraponto a este pensamento, com base nos estudos de Rangel Netto, que o processo da mestiçagem ocorre desde sempre, em maior ou menor grau, e é o processo natural de qualquer sociedade, uma vez que dificilmente exista uma entidade viva de origem pura ou estática.

Já no capítulo 2, Inauhiny aborda a composição étnica e social da Província do Amazonas no século XIX, destacando a presença de diferentes grupos na região, incluindo indígenas, brancos e negros (escravos ou libertos), assim como as tensões e conflitos entre eles. O autor também fala sobre a importância dos jornais da época como fonte de informação sobre a sociedade provincial e a presença de escravos e libertos na região.

Na seção 2.1, o historiador destaca a presença dos grupos indígenas na região, que eram descritos em documentos oficiais como “população civilizada”, além de outros termos como caboclos, tapuios e gentios. Além disso, ele menciona a dinâmica urbana da cidade de Manaus a partir de 1850, que estava relacionada ao crescimento da capital da Província e à maior circulação de bens e mercadorias na região. Era notável a presença de uma população multiétnica na Província, composta por brancos, negros (escravos ou libertos) e mestiços, além de estrangeiros que circulavam pela região. Depois, os jornais da época são uma grande fonte de informação sobre a sociedade provincial, refletindo as tensões e conflitos entre os diferentes grupos étnicos e sociais.

Na seção 2.3, é abordada a questão dos escravos e libertos e a importância desses grupos na economia local, especialmente na produção de borracha e na construção de edifícios públicos e privados. Além disso, o autor relata a forma como os escravos eram tratados na região, a violência e a exploração a que eram submetidos. Por último, o historiador menciona a importância da abolição da escravidão na região, que ocorreu em 1884, e seus impactos na sociedade provincial.

Ao longo do capítulo 3, o historiador trata da representação dos trabalhadores nos jornais da Província do Amazonas no século XIX, com destaque à importância desses periódicos como fonte de informação e espaço de debate sobre a questão do trabalho e da escravidão na região. Também expõe a presença de estereótipos e preconceitos raciais na forma como os trabalhadores eram retratados nos jornais, além de analisar a forma como os conflitos sociais eram noticiados.

Na primeira seção deste capítulo, o historiador enfatiza a relevância dos jornais como fonte de informações sobre a vida cotidiana dos trabalhadores, especialmente os escravos e libertos, enquanto na seção 3.2, ele aborda a forma como os jornais retratavam os trabalhadores, especialmente a presença de estereótipos e preconceitos raciais.

Para ilustrar esta sociedade, no final do capítulo 3, Inauhiny narra a trajetória de Daniel Pedro Marques de Oliveira. Daniel nasceu na Província do Pará, filho da escrava de seu pai. Sendo também escravizado, ele logo adotou a estratégia de encontrar nas ordens religiosas o acesso a oportunidades e, durante as décadas de 1860 e 1870, exerceu atividades de destaque como professor e deputado provincial. Como deputado, ele denunciou a manutenção irregular de uma mulher como cativa na Vila de Silves e defendeu os direitos da cidadã. Ele construiu uma rede de relações sociais e políticas que lhe garantiram relativo sucesso em seus objetivos, incluindo sua ascensão social e sua atuação como deputado e vice-presidente da Assembleia provincial. Além disso, também foi acusado de cumplicidade no açoitamento de escravos fugidos e defendeu autoridades públicas acusadas de perseguição política.

Por fim, “Nascidos no Grêmio da Sociedade: racialização e mestiçagem entre os trabalhadores na província do Amazonas (Brasil, séc. XIX)” nos oferece uma perspectiva única, uma vez que aborda a formação da classe trabalhadora da Região Norte do Brasil. A complexa teia de racialização, mestiçagem e estratificação social que caracterizava essa sociedade se torna cada vez mais fascinante após esta leitura. O autor habilmente explora as nuances das relações étnicas e culturais entre indígenas, negros libertos e brancos, demonstrando como esses grupos interagiam, organizavam-se em grêmios e sobreviviam à escravidão e à opressão racial.

Este livro nos convida a compreender melhor a rica e complexa tapeçaria social do Amazonas do século XIX e entender a importância de dar mais atenção às trajetórias dos trabalhadores mestiços. Em suma, “Nascidos no Grêmio da Sociedade: racialização e mestiçagem entre os trabalhadores na província do Amazonas (Brasil, séc. XIX)” é uma leitura essencial para aqueles que desejam explorar a história da formação da classe trabalhadora no Brasil, especificamente no Amazonas, e suas complexas dinâmicas raciais, em especial numa região com tamanha presença de indígenas, pretos e pardos.

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