Composições prosaicas: estudos sobre o processo de aprendizado e didatização musical

Neste mês de junho, a Editora UEA apresenta a obra Leitura e Escrita Musical em Perspectiva(s), organizada pela professora doutora em música Caroline Caregnato e publicada no ano de 2021. O livro reúne seis trabalhos acadêmicos escritos por pesquisadores e professores universitários da área da música que debatem acerca dos processos de leitura e escrita musical, tais quais, “a iconografia, a história, a análise, a cognição e a educação musical” (CAREGNATO, 2021, p. 6).

No primeiro capítulo, A lição da música do Falsário de Guercino, gravado por Francesco Bartolozzi (c1764), os pesquisadores Márcio Páscoa e Luciane Páscoa, narram alguns eventos da vida artística de Francesco Bartolozzi, assim como apresentam a polêmica discussão acerca da veracidade de algumas obras atribuídas ao pintor. Especula-se a possibilidade de fraude, porque, ao analisarem traços estéticos e marcas características do pintor, os pesquisadores perceberam a existência de diferenças díspares entre as demais obras. No decorrer do capítulo, os autores focam na observação dos retratos das partituras musicais e quais os principais efeitos práticos musicais estão objetivados em cada situação, pois, segundo eles, existem diferenças eminentes entre as atividades musicais propostas nas partituras e nas pinturas do falsário e do Bartolozzi.

O segundo artigo, Solfejos galantemente acompanhados, foi escrito pelo professor Mário Trilha. O escritor relata acerca da técnica do solfeggio e descreve seu processo histórico de aprimoramento. Ele aponta que o solfejar consistia em “cantar” as notas musicais ou as vogais acompanhando a música para facilitar a assimilação da leitura das partituras e expõe de maneira didática a técnica do solfejar, trazendo uma explicação teórica e de aplicação detalhada, enfatizando as discussões sobre as diferenças entre os solfejos e se tal técnica facilita ou complica a absorção do conteúdo, referenciando a visão de diversos mestres musicistas para aprofundar sua pesquisa, tais quais, Antonio Vivaldi, o padre Mello de Jesus, Haymoz e o pernambucano Luís Álvares Pinto. Por fim, o autor comenta dos avanços artísticos que a técnica de solfejar trouxe para as produções musicais de grande escala e para a assimilação e aprimoramento musical, como também, comenta que tal didática deve ser adotada nas aulas de música e em projetos que envolvem técnicas musicais.

O terceiro trabalho, Alturas diferenciais em La Espiral Eterna, de Leo Brouwer: análise e percepção musicais, o pesquisador Márcio Pacheco de Carvalho discute o impacto que os eventos do século XIX e as vanguardas tiveram sobre a forma de se produzir arte dando enfoque na obra “experimental” do cubano Leo Brouwer, “La Espiral Eternal”. O autor busca apresentar uma análise da forma composicional da música e como tal estrutura sonora culmina na percepção dos ouvintes. O conceito analítico apresentado é o de altura diferencial que, conforme o autor, consiste na sequência de sons que se apresentam em uma música de maneira a repetir um determinado ritmo sonoro, podendo se analisar (e perceber) a troca entre tempos musicais e os níveis macroestruturais e microestruturais da forma. Ele conclui dizendo que apesar de não ser um estudo novo, a pesquisa funciona como uma atualização visto que trabalhos com essa temática eram limitados na época em que foram conduzidos e convida para mais pesquisas acerca da altura diferencial.

O quarto capítulo, Reflexões sobre o letramento musical a partir de uma abordagem ausubeliana: a aquisição da escrita como um desafio da aprendizagem significativa, foi escrito por Ronaldo da Silva e Herton Fabiano Tramontin. Os autores discutem o processo de desenvolvimento do ensino da música no Brasil e afirmam que os indivíduos que a produzem e aqueles que somente a escutam participam do processo de enculturação musical e fazem parte do desenvolvimento do letramento musical (GREEN, 2001 apud SANTIAGO, 2006 apud SILVA &TRAMONTIN, 2021). Em síntese, eles defendem o ensino prático da música em detrimento ao teórico, pois nota-se que os aprendizes imersos no aprendizado significativo da música guardam melhor as informações adquiridas em contraponto aos aprendizes técnicos que “esquecem” com mais rapidez.

O penúltimo artigo, O ensino remoto de Teoria e Percepção Musical durante a pandemia da Covid-19: Experiências com a promoção da autorregulação da aprendizagem, escrito pelo pianista e professor Pablo da Silva Gusmão, evidencia o nível desregular de conhecimento teórico da música pelos acadêmicos iniciantes nos cursos de nível superior e comenta como isso prejudica as aulas e os alunos. Como solução pensada entre os discentes dos cursos, o autor apresenta a disciplina de Teoria e Percepção Musical, que, para ele, é a forma de nivelar os alunos do superior.

Dadas essas considerações, ele aponta outra dificuldade enfrentada pelos discentes nesses nivelamentos: a pandemia do COVID-19, que se tornou um desafio, pois precisavam repensar como aplicar tal disciplina em meio remoto. Pensando em novas maneiras de aplicação da disciplina e para evitar a evasão de alunos da universidade, o professor propôs a autorregulação da aprendizagem. Ele comenta que os professores deviam proporcionar práticas que motivem os alunos a desenvolverem independência nos estudos de percepção musical e apresentarem o retorno positivo das atividades por eles pensadas e realizadas. Através desta atividade, o escritor expõe os resultados positivos da atividade e ainda diz que tais técnicas deviam ser abordadas por outras disciplinas e não somente a de Teoria e Percepção Musical.

O último capítulo, Avaliação do ditado em Percepção Musical: por que e o que avaliar? escrito por Caroline Caregnato, Pablo da Silva Gusmão e Cristiane Hatsue Vital Otutumi, os autores comentam os métodos avaliativos na educação, principalmente na disciplina de Percepção Musical, que não são intrínsecos mas se acompanham no âmbito acadêmico.

Segundo os autores, essas avaliações são na grande maioria injustas com a pluralidade individual dos alunos. No entanto, eles não as excluem, como muitos que relativizam as avaliações, sendo incapazes de realmente formar profissionais em suas áreas, mas denotam que somente através de um determinado método avaliativo eficaz é possível ter um retorno ante a preparação do estudante para exercer a sua função em sociedade ou para seguir os estudos adiante.

Os pesquisadores fazem questão de frisar que os professores devem ter consciência de seus métodos de avaliação e que não limitem seus alunos a números e certificações. Para isso, apoiam-se na teoria das múltiplas inteligências de Howard Gardner, buscando, com tais atitudes, a elaboração de um método “avaliativo”, em que ocorra um alcance maior e mais justo de avaliação.

Eles propõem que os ditados musicais devem, além de analisar somente os erros e os acertos dos alunos através de sua percepção auditiva e escrita musical, abrir espaço para discussão do porque tais desvios de compreensão foram cometidos e, por meio disso, elaborar propostas que os amenizem sem que ocorram avaliações inválidas que induzam o estudante a cometer erros. Com isso, os autores salientam que o professor deve ser observador e crítico nas suas aulas e não siga uma “receita” específica, mas reorganize seu plano e trabalhe em conjunto com sua turma.

Na finalização da obra, temos informações biográficas sobre os autores. Pode-se perceber, tendo em vista os trabalhos apresentados, a preocupação dos autores com a didatização do método de ensino da música nas universidades e demais áreas com o mesmo intento, pois sempre discutem o entendimento teórico e prático da música, aproximando e nivelando os grupos que possuem interesse em aprimorar seus conhecimentos nas várias áreas de estudo da área.

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