Falar sobre gênero é, antes de tudo, refletir sobre desigualdades, resistências e a luta pela existência, reconhecimento e dignidade. Discutir gênero, raça, classe e sexualidade significa compreender como essas categorias se entrelaçam, estruturam opressões e, ao mesmo tempo, impulsionam resistências, fortalecimento identitário e reivindicação de direitos.
Com o objetivo de ampliar essas reflexões, a Editora UEA seleciona como livro do mês de junho Estudos de gênero: diálogos, perspectivas e possibilidades, uma coletânea de oito artigos organizada por Cláudia Maria de Farias, Julio Claudio da Silva e Joceneide Cunha dos Santos.
Publicado em 2024, o livro destaca a importância dos Estudos de Gênero no Brasil, articulando-os com classe, raça, etnia, sexualidade e geração no campo da História. Analisa os sistemas de dominação na sociedade brasileira e evidencia os diferentes modos de ser mulher, refletindo sobre resistências, ativismos e enfrentamentos às opressões do binarismo, da misoginia e do sexismo.
Dividida em duas partes — Gênero, transgressões e ativismos e Gênero e mundos do trabalho — a obra aborda debates teórico-metodológicos e pesquisas, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.
O artigo que introduz os estudos sobre gênero, Mulheres e participação política durante a democratização brasileira, de Joana Maria Pedro e Eloisa Rosalen, analisa o engajamento de mulheres nas lutas políticas no pós-ditadura, destacando aquelas que começaram na resistência, refletindo sobre o significado desse engajamento. Ao trazer à tona as vozes de mulheres, muitas vezes silenciadas pela história oficial, é ressaltado a importância de reconhecer o papel das mulheres na luta por direitos e pela consolidação da democracia.
O estudo de Julio Claudio da Silva, Interseccionalidade, pioneirismos e protagonismos históricos nas trajetórias de Ruth de Souza, Léa Garcia e Zezé Motta (1940-1960), mostra como raça, gênero, classe e geração se entrelaçam nas trajetórias dessas atrizes. Apesar dos estigmas e discriminações associadas à imagem da mulher negra, suas carreiras foram formas de resistência e abriram caminhos para outras mulheres negras no cenário artístico. Nesse sentido, o texto contribui significativamente para os estudos interseccionais ao demonstrar como essas atrizes não apenas resistiram às estruturas opressoras, mas também protagonizaram lutas por direitos, reconhecimento e transformação social.
A pesquisa Relações de gênero nos esportes: avanços e perspectivas na historiografia brasileira, de Cláudia Maria de Farias, traz uma análise sobre gênero no esporte, refletindo sobre os desafios e preconceitos, especialmente na participação feminina no futebol, e denuncia as estruturas que sustentam a exclusão das mulheres nesse meio. Ao problematizar essas questões, a autora não apenas amplia o debate sobre gênero no esporte, mas também denuncia as estruturas históricas que sustentam a exclusão e o silenciamento das mulheres nesse contexto.
No artigo Memória, gênero e protagonismos quilombolas no Amazonas: desafios e possibilidades a partir de narrativas de mulheres quilombolas do Rio Andirá, fronteira Amazonas/Pará, João Marinho da Rocha analisa como a memória e a oralidade são fundamentais na construção da identidade das comunidades quilombolas do Rio Andirá. As mulheres são protagonistas na transmissão dos saberes e na luta por território, direitos e autonomia.
Ao discutir identidade, resistência e gênero, o autor evidencia que a luta quilombola vai além da busca por território, envolvendo também a valorização dos saberes femininos e a desconstrução de estruturas opressoras. Este estudo traz uma importante contribuição para os estudos sobre memória e movimentos quilombolas na Amazônia, reforçando a necessidade de reconhecer o papel das mulheres negras nesses processos.
No texto História oral e memórias de travestis e transexuais nos movimentos sociais LGBT (Manaus/AM — 1997-2017), Michele Pires Lima, com base no feminismo negro e na história oral, analisa, por meio de entrevistas, as vivências de travestis e mulheres trans em Manaus, destacando suas trajetórias de resistência frente à violência, estigma e marginalização. Ao articular memória, identidade e resistência, a autora ilumina as dinâmicas de exclusão e as estratégias de enfrentamento mobilizadas por travestis e mulheres trans em Manaus, reafirmando a importância da história oral como instrumento político, acadêmico e de fortalecimento coletivo.
O artigo Entre baldes, vassouras e movimentos sociais: um perfil das(os) sindicalizadas(os) do Sindoméstico/BA e as suas alianças políticas (1990 a 2013), de Joceneide Cunha dos Santos e Maria Heloísa Lima, discute como esse sindicato se articula com movimentos sociais, destacando a luta das trabalhadoras domésticas, atravessada por gênero, classe e raça. A pesquisa revela que a maioria dos cargos e dos filiados é composta por mulheres, o que reforça a discussão sobre gênero e trabalho. Além disso, evidencia como a interseccionalidade — gênero, classe e raça — atravessa a trajetória dessas mulheres que enfrentam históricas desigualdades sociais.
O texto Minerva reverencia Iansã: gênero, raça e identidade na Polícia Militar da Bahia, de Marcos Santana de Souza, analisa como gênero, raça e identidade se cruzam na trajetória de uma Major da PM da Bahia, refletindo sobre os desafios de mulheres negras em profissões masculinizadas e as reações sociais diante disso. A análise de Marcos Santana vai além da questão de gênero, ao trazer também o impacto da identidade de Denice Santiago — como mulher negra, candomblecista e filha de Iansã — mostrando como esses elementos influenciam sua visibilidade social e midiática.
Por fim, As mulheres e a produção do beiju de Vale Verde: notas sobre as relações de gênero e divisão de trabalho, de Ivaneide Almeida da Silva, apresenta a atuação das mulheres na cadeia de produção do beiju em Porto Seguro, Bahia, evidenciando seu papel na economia familiar e local. Além das questões de gênero e trabalho, a autora apresenta discussões sobre etnicidade e identidade, mostrando como essas mulheres carregam heranças culturais indígenas e caboclas. Dessa forma, a pesquisa contribui para pensar as relações entre gênero, trabalho e cultura a partir de uma perspectiva interseccional e territorializada.
A obra Estudos de gênero: diálogos, perspectivas e possibilidades reúne reflexões fundamentais sobre como gênero, raça, classe se entrelaçam na construção das desigualdades e resistências. Os artigos destacam trajetórias marcadas por opressões, mas também por protagonismos e processos de transformação social, reforçando a importância dos estudos de gênero como ferramenta analítica e política voltada à justiça social, especialmente nas realidades do Norte e Nordeste.
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